2009/09/20

Moção sobre educação (MCE)

O Movimento Católico de estudantes, publicou uma moção sobre educação, na sequência do seu 30º conselho nacional.
Porque falam de coisas que também me interessam, gostaria de partilhar aqui algumas ideias. Como sempre, aviso que não quero julgar nada nem ninguém; apenas pensar alto.

Português
Não sei se a moção foi redigida altas horas da noite, se houve dificuldade a chegar a consensos... mas o português onde aquilo está redigido é bastante difícil de ler. Isto já vai sendo uma mania que nós temos em Igreja: escrever complicado e sem respeito pela paciência dos possíveis leitores.

As ideias
Não conheço a tradição do MCE e das suas moções. Mas fiquei com uma sensação triste ao ler este texto. A respeito de educação faz umas declarações soleníssimas, genéricas mas com pouca atenção à pluralidade cultural que existe hoje. Nota-se que estão dominados pelo binómio educação-escola; e passam ao lado da pluralidade de plataformas que hoje, melhor ou pior, com mais ou menos valores, fazem educação: os media, as redes sociais, a internet...

As pérolas
A escola deve ser o motor primordial de desenvolvimento cultural de cada indivíduo, NO WAY! Porque é que a escola tem de ser isso? Quem disse? O sujeito não pode escolher onde faz o seu desenvolvimento cultural? Este é mais um daqueles exemplos de "dogmatismo" nos agentes eclesiais: por qualquer razão, mete-se uma ideia (até boa) na cabeça e toca a debotar isso como dogma; sem verificar se isso acontece mesmo; sem distinguir entre o que é e o que deve ser; e, claro, sem identificar o que é necessário para passar do real ao ideal.

Afirmar, conscientemente, a importância da reflexão e integração dos valores na educarão em escola, é também sublinhar que se torna sumariamente fundamental, garantir nas primeiras fases do percurso escolar, que esta seja reconhecida, significativamente, nos sistemas de avaliação do aluno, de forma que este tenha consciência da importância destes valores na sua vida.
Juro que não é por maldade que vos obrigo a ler este parágrafo. Não é falta de cultura tua; a frase é mesmo difícil de entender. Se eu entendo bem a ideia é que a escola deve apostar forte numa educação aos valores. (Não explicam bem quais são, como gerir a pluralidade que há sobre quais deveriam ser.) E para isso, "nas primeiras fases do percurso escolar" (até onde é que isso vai?) o empenho dos alunos nessa educação aos valores deveria entrar na nota. Percebi bem? Já viram até que ponto isto é reaccionário? E perigoso? Como é que se avalia a "importância da reflexão e integração dos valores"? Pela capacidade de elaborar um discurso "politicamente correcto"? Por ser "um menino bem comportado"?

Esta é a era dos números e das percentagens, das estatísticas. Mais do que isto, preferimos a qualidade do ensino, a garantia de melhores espaços de educação, das melhores práticas e metodologias, do maior e melhor desenvolvimento.
Mais poesia perigosa. Em vez de fazerem uma crítica a sério dos pressupostos epistemológicos que podem estar por detrás das várias utilizações das estatísticas e dos métodos de avaliação, em vez de denunciar o uso fraudulento que este governo tem feito dos números na educação, decidem abaondonar a "frieza" dos números em favor de uma vaga e indefinida qualidade. E deixam por responder algumas coisas: Como é que se verifica essa qualidade? Quem é que define o que é qualidade?
Continua

O futuro da educação passa por exigir de cada um de nós a certeza de que as práticas educativas deixarão de ser instrumentalizadas e de se encontrar ao serviço de interesses alheios, perdendo o seu verdadeiro sentido.
Quais interesses alheios?


garantir que todo o processo educativo tem, antes de mais, presente o desenvolvimento livre de cada indivíduo, oferecendo-lhe oportunidades, contrariamente ao que tem acontecido: criar-lhe apenas condições.

Mais uma vez, é melhor nem comentar o português. Mas há aqui mais coisas. Se bem percebo, estão em oposição "oferecendo-lhe oportunidades" a "criar-lhe apenas condições", sendo esta uma situação a evitar. ?!?!
O que é que isto quer dizer? Para lá do "gozo" que pode dar a confusão de ideias e de português talvez haja aqui matéria para objecções mais sérias. A educação que se deseja deveria,s e bem entendo, ir mais além do que dar às pessoas condições.
É isso? Mas então consiste em quê? Em renunciar ao princípio da responsabilidade e liberdade pessoal, que, julgava eu, era uma "verdade" quase inquestionável?

todos devemos ter igualdade no acesso à educação, travando-se a luta pelo fim da marginalização que, muito frequentemente, ainda vemos acontecer nas escolas portuguesas. O valor da igualdade é, por tudo isto, a alternativa a esta realidade; igualdade no acesso à educação, igualdade nas oportunidades de aprendizagem ao longo do desenvolvimento (a organização do espaço escolar não deve discriminar pessoas pelas suas diferenças individuais, mas antes tentar a sua inclusão)
Mais uma vez teria sido bom se fossem mais concretos e pudessem identificar os processos e as causas da dita marginalização. Porque se o fizessem seria mais fácil avançar com propostas credíveis para mudar a situação.
De todo não concordo que o valor da igualdade seja o motor para superar estas marginalizações.

Não poderíamos fechar esta reflexão em torno da educação, sem antes dizer o que habitualmente o Movimento vem dizendo aos seus militantes, mudar a organização da educação está ao alcance de cada um, parte deste já dito fenómeno complexo.


É aqui que se percebe que o essencial é mudar a organização da educação. Será mesmo?
Para mudar a organização não seria conveniente antes mudar outras coisas?

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