2012/02/18

Para uma renovação da pastoral juvenil em Portugal (3)

Artigo anterior desta série: As palavras-chave, Os pressupostos


3. As metas

Posto tudo isto… e agora? Por onde começar a desenhar uma PJ no contexto da nova evangelização? Comecemos então, não pelo princípio mas pelo fim. Por clarificar as metas que devemos atingir. Não estamos ainda ao nível dos objectivos pedagógicos, empiricamente verificáveis. Estamos ao nível dos ideais que, não sendo utópicos, nascem do discernimento eclesial.

3.1 O perfil do crente

Começamos por explicitar o perfil do crente . Assumimos que a meta da PJ, como de toda a evangelização, deve ser o adulto crente. Porque só essa meta realiza em pleno a nossa humanidade. Porque apontar a menos que isso é uma dupla traição: aos jovens e ao Evangelho.

3.1.1 O quotidiano

Procuramos um crente que veja na vida concreta o lugar do encontro com Deus. Na raiz desta visão positiva da vida está a força da Incarnação do Verbo. Desde Jesus, o lugar para encontrar Deus é a realidade humana. Procuramos um crente capaz de reflectir sobre a própria vida, capaz de descobrir os valores que se encontram no quotidiano, capaz de assumir com coerência a existência, valorizando tudo o que ela tem de positivo. Mas esta espiritualidade do quotidiano manifesta-se também como sentido crítico face à cultura dominante, como apelo a gerar, aqui e agora, uma cultura e um estilo de vida alternativos em relação ao modelo dominante.

3.1.2 Alegria e optimismo

Procuramos um crente que reage ao cinzentismo cínico dos dias de hoje com alegria e optimismo. Alegria e optimismo que não nascem do politicamente correcto mas da experiência gozosa da vitória de Cristo ressuscitado contra todas as forças do mal e da morte. Procuramos um crente que, mesmo no meio das tantas dificuldades da vida, sabe que a vida tem sentido. Esta atitude constante de alegria e optimismo torna-se um estímulo para um empenho pessoal na construção de uma personalidade mais madura. E torna-se testemunho provocante para todos os desanimados.

3.1.3 Uma forte amizade com Jesus, o Senhor

No centro existencial deste crente está a pessoa e o mistério de Jesus Cristo. O jovem que sonhamos não se contenta com uma vaga simpatia face ao Nazareno. Quer estreitar laços de amizade profunda com Jesus. Amizade que se concretiza no conhecimento aprofundado da verdade que Ele nos deixou e na adesão entusiasmada à sua pessoa e à sua causa. É esta relação de proximidade com Jesus que permite o acesso ao rosto verdadeiro de Deus Pai e ao dinamismo poderoso do Espírito.
Esta relação de amizade é alimentada na escuta da sua Palavra e na celebração dos seus sacramentos, fonte de vida nova.

3.1.4 Em forte comunhão eclesial

Num tempo de forte individualismo, afirmamos a Igreja como espaço onde Cristo Se oferece e pode ser encontrado. Falamos da Igreja ideal e da Igreja concreta, com as suas debilidades e contradições, sempre animada pela presença do Ressuscitado. Propomos a Igreja como católica, universal: casa comum onde todos os que se deixam amar pelo Senhor têm lugar, apesar das diferenças.

3.1.5 Em ordem ao serviço responsável

O crente que sonhamos tem uma convicção: que a vida é vocação, projecto a descobrir e realizar. Na categoria de vocação convergem a iniciativa de Deus e o desenvolvimento pessoal. Procuramos um crente que configura o seu estilo de vida, a sua colocação na sociedade, na mesma lógica de Jesus: como serviço e doação de vida.

3.2 A Igreja a construir

O Vaticano II e o magistério posterior fizeram um belo trabalho ao pensar trinitariamente a Igreja. Alguns confundiram o esforço de renovação com uma acomodação a modelos sociológicos contemporâneos. O que gerou algum bloqueio operacional na renovação das nossas práticas de ser Igreja. Mas as dificuldades não nos podem eximir de procurar as opções concretas que devem configurar o rosto da Igreja no século XXI.

3.2.1 Uma Igreja de adultos e não de consumidores infantis

Procuramos uma Igreja feita de gente com fé adulta, autónoma, interiorizada. Uma Igreja cujos fiéis superam uma fé sempre em segunda mão ou uma fé hibridada com as ideologias dominantes. Uma Igreja que estimula as pessoas a tornarem-se adultos livres, conscientes, responsáveis. Uma Igreja que trata a todos como adultos. Na gestão das decisões, nas propostas pastorais, na co-responsabilidade. Uma Igreja que supera de vez os novos e velhos clericalismos.

3.2.2 Uma Igreja que acolhe diferentes velocidades e participações

Entre uma Igreja de ampla adesão e baixa qualificação e a tendência sectária (estilo “poucos mais bons”) é possível imaginar uma Igreja que quer adultos fortemente comprometidos e, ao mesmo tempo, não fecha as portas aos peregrinos e aos convertidos. Àqueles que não são ainda cristãos adultos.

3.2.3 Igreja-comunhão feita com fortes interacções

Uma Igreja que queira ser no tempo da pós-modernidade, continuação da comunhão trinitária, tem de se tornar um espaço pleno de interacções ricas e frequentes. Um espaço onde se supera a atitude “clientelar” e o dirigismo vertical. Uma Igreja onde, a todos os níveis, os contactos, as trocas, o fluxo de vivências e informação são facilitados e promovidos. Uma Igreja assim, corresponde à sua matriz criadora (que vos ameis uns aos outros como eu vos amei) e assume-se como contracultura do individualismo reinante.

3.2.4 Uma Igreja atenta aos mais frágeis

Esta Igreja que sonhamos aprende com o Senhor Jesus a manter a comunhão. Mas, ao mesmo tempo, está em movimento para ir ao encontro dos mais frágeis, dos mais pobres. Sabe identificar à luz da fé as novas e velhas pobrezas e sabe reconfigurar-se em ordem à partilha.

3.3 Uma sociedade nova

Em termos de metas, um projecto de pastoral juvenil deve fazer opções quanto ao tipo de presença transformadora no mundo que queremos ser. Não bastam as exigências relativas à condição juvenil; um projecto de pastoral juvenil não renuncia a educar os jovens à dimensão económica, social, ecológica, política. Só assim se garante que as novas gerações eclesiais vão ser fermento activo na transformação da sociedade.

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