2009/04/06

Grande abanão 4

As notícias são as de sempre. A contagem dos mortos é que continua a subir.
Uma reflexão um bocado à margem, a aprofundar o que disse no post anterior.
Esta notícia (terramoto 6.3; dezenas de mortos) é notícia em Portugal. Mas se tivesse ocorrido na Índia não seria notícias em Pt. Há um filtro "geográfico" nos critérios jornalismos; mas há também "racismo". Os "nossos" mortos pesam mais do que os mortos "deles". Lembram-se da cobertura quando foi do Tsunami na Indonésia? já havia dezezas de milhares de mortos confirmados e as peças dos jornalistas PT ainda se preocupavam com o mau acompanhamento que as agências de viagens estavam a fazer...
É que apesar da proximidade que os meios propiciam, o mundo ainda não é uma aldeia; há sempre um aqui e um ali.
A 1ª notícia que o Público pôs on-line foi esta.
Tenham a paciência de ler os comentários do fim para o início.
Aquilo que me impressionou foi o solipsismo. Ou seja. hoje temos muitos meios de comunicação: jornais online, caixas abertas de comentários...
Mas a verdade é que não há comunicação. O que aqueles comentários evidenciam é que não há (porque não conseguem ou porque não podem) ligação entre os leitores-comentadores e o evento (e as pessoas vítimas do evento). A maioria dos comentários fala do seu umbigo. Por isso disse (é um pouco ridículo citar-me a mim mesmo, mas...)
Não costumo comentar por aqui nem vou comentar a notícia do Público (com algumas incorrecções). Estou aqui em Roma e senti bem o terramoto (estamos a 130 kms). Mas é interessante como se "vê" este acontecimento aqui (Roma) e aí (Portugal). O à-vontade como tantos comentadores falam de tudo e de nada, do que lhes vai na cabeça, do que lhes amarga o fígado, das agendas ideológicas que trazem (e que é perfeitamente legítimo) pode ser visto por quem está mais perto (e por quem tremeu de madrugada) como imensamente... ocioso. Continuem a mandar bitaites; é legítimo. Mas aqui, as mortes, as lágrimas, a impotência... legitima outras coisas. E lanço só a hipótese que comentar tragédias dessa forma pode ser sentido como insultuoso. Porque "mentiroso", na medida em que "oculta" o essencial dos factos: a experiência do comentador (seguro e sentado atrás do seu teclado) sobrepõe-se à experiência de quem perdeu tudo.

É certo que a net gera uma ecologia muito básica, muito primária. Mas não sei se não haverá um problema mais sério de atitude comunicacional

1 comentário:

Anónimo disse...

A proximidade é um dos critérios que define o que é notícia. Na nossa vida também é assim: a morte de familiares de amigos tocam-nos mais do que a morte de familiares de conhecidos.

***
Para quem se interessa por estas coisas da comunicação, sugiro a leitura do resumo das teorias que se foram elaborando nesta área. A entrada é sintética, nalgumas coisas está curto, mas creio que dá para integrar o fenómeno / discussão lançada pelo Rui

http://pt.wikipedia.org/wiki/Teoria_da_comunica%C3%A7%C3%A3o