2009/04/08

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2. Status quaestionis
2.1 Pesquisa feita em Portugal
Há, em Portugal, estudos feitos nas últimas décadas a indicar que uma percentagem superior aos 90% da população afirma acreditar em Deus . O facto de esse dado não ter correspondência em outros indicadores de identidade cristã legitima a dúvida se o constructo “acreditar em Deus” das pesquisas coincide com a tradição eclesial católica.
Há um conhecimento razoavelmente seguro que uma percentagem elevada da população afirma acreditar em Deus mas não sabemos exactamente o que isso significa.
Esses estudos não se preocupam em dirimir a questão ou fazem-no de forma muito rudimentar, com impostações teóricas débeis.
2.2 Deus e a psicologia
A investigação psicológica internacional tem-se centrado sobre as representações conceptuais de Deus, a identificação dos factores relacionados ou preditivos dessas representações e/ou no desenvolvimento das representações do conceito de Deus.
A maioria das pesquisas tem um ponto de partida individualista, que tende a ignorar o papel que os contextos socioculturais e as práticas pastorais têm na configuração da realidade.
Deus teria que ver com a imagem paterna mas também com a imagem materna
2.3 Deus e a sociologia
A investigação de tipo mais sociológico, quase sempre condicionada pelo princípio do “ateísmo metodológico” tem sofrido uma forte dicotomia entre “Deus” (reservado ao discurso teológico) e a condição humana (resumida às ciências sociais).
Segundo Piette, a dicotomização do ateísmo metodológico assume quatro formas.
A primeira consiste em reduzir Deus a projecção social. Deus, que não tem outro estatuto ontológico que o de ser projecção social, não pode ser estudado. É a posição de Durkheim. A segunda forma consiste na dissolução social. Deus não é mais que um suporte passivo para os valores do grupo, a imaginação social. A terceira forma é a exclusão teológica. Assumida por crentes e não crentes, esta forma radicaliza o ateísmo metodológico e considera Deus como intocável, exterior à cultura humana. Só a teologia pode falar de Deus como objecto. A sociologia nada poderia dizer. A quarta forma reside na anulação humano-cêntrica, de inspiração weberiana. Esta forma interessa-se pelos sujeitos religiosos, pelas estruturas sociais que constroem. Esta perspectiva elimina Deus do seu horizonte de interesse. Considerado como não pertinente, Deus perde estatuto analítico.
Teses, agora clássicas, como a da descristianização progressiva ou a da dissolução do cristianismo num sincretismo consumista são afirmadas sem dados empíricos de suporte nem análise rigorosa dos pressupostos teóricos.
2.4 Um balanço feito pelo lado da prática
Schweitzer, na perspectiva do educador religioso, elenca um conjunto de cinco razões para o desilusão diante da qualidade de muita investigação feita:
• Há uma tensão entre afirmações sobre temáticas religiosas e a inserção contextual do sujeito. As afirmações religiosas, se são consideradas isoladamente do contexto vivencial dos sujeitos podem facilmente induzir em erro.
• há uma certa frustração com a fixidez fotográfica de alguns resultados que não têm em consideração os processos de mudança religiosa e desenvolvimento em curso na pessoa.
• Uma outra tensão resulta da diferença entre a fé actual e a fé potencial da pessoa.
• Uma outra fonte de tensão acerca dos aspectos normativos das investigações. Supostamente a investigação empírica seria value-free para ser objectiva. Mas os educadores religiosos ficam frustrados com esse tipo de investigação que é sempre guiado por pressupostos teológicos e ideológicos não admitidos e, por isso mesmo, nunca discutidos ou postos em causa.
• Uma dificuldade final é a tensão entre a estrutura ou função da religião e o conteúdo religioso.

2.5 Um balanço epistemológico
Tem havido uma série de pressupostos epistemológicos, raramente postos em discussão, que têm condicionado a qualidade e relevância dos resultados.
A questão de Deus, no plano das ciências humanas, tem sido muitas vezes estudado numa perspectiva diádica, entre sujeito e objecto.
Tem sido também estudada numa causalidade linear, que tende a esquecer a complexidade dos sistemas sociais, culturais e religiosos em que estamos inseridos.
As abordagens feitas até aqui ou assumem um carácter positivista (que não resiste à crítica legítima) ou remetem para uma fragmentação radical (religião faça você mesmo) que impede o conhecimento (que é sempre conhecimento do geral) e uma prática pensada e renovada.
2.6 Resumindo
O tema do acolhimento que os catequizandos adolescentes dão ao anúncio do mistério de Deus está pouco estudado e a investigação análoga não é aplicável directamente.
Embora o determinismo da tese da tese da descristianização progressiva não seja aceitável, a verdade é que as agências religiosas (família cristã, paróquia, catequese…) não são já as únicas a contribuir para a formação da imagem de Deus.

A pesquisa recente sobre a “imagem de Deus” tem, na sua maioria, oscilado entre o somatório de descritores atribuídos à “imagem de Deus” e a tentativa de encontrar explicações causais (quase sempre de tipo psicológico).
A revisão da literatura lança a hipótese que haverá vários factores a influenciar esse processo:
a) Os processos psicossociais ligados à família;
b) As experiências pessoais;
c) Os processos instituídos de formação religiosa (catequese sistemática, participação na liturgia);
d) Os conteúdos propostos pelo sistema escolar;
e) Os sistemas de valores presentes na sociedade portuguesa;
f) A tematização feita pelos media;
g) Os processos evolutivos específicos da adolescência.
As abordagens mais sociológicas indiciam vários fenómenos:
a) As mulheres apresentam indicadores de crença em Deus mais elevados;
b) Diminuição da crença com a idade;
c) Dificuldade de perceber se se trata de uma mudança real ou de um efeito de coorte;
d) Individuação do processo de crença
e) Indefinição pessoal dos conteúdos de fé e oscilações rápidas
f) Tendência apofática

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